A reportagem publicada por este jornal no domingo passado sobre o crescimento da folha de pagamento do município de Joinville em 119%, quando a receita aumentou apenas 45% no mesmo período, reforça nossa crença de que, no Brasil, existem dois tipos de cidadãos: aqueles que pertencem ao funcionalismo público e os outros.
Estudo realizado em 2007 pela revista Exame mostra que o salário médio dos colaboradores das 150 melhores empresas para trabalhar no Brasil era de R$ 3.500,00. No mesmo período, o salário médio dos servidores do executivo era de R$ 4.300,00. No caso do legislativo, a média chegava a R$ 13.300,00 e no Judiciário, a média era superior a R$ 15 mil mensais.
Considere que uma parcela significativa desses servidores trabalha apenas seis horas por dia, tem um período superior a 30 dias de férias (férias forenses, licenças-prêmio etc), que não podem ser demitidos sem justa causa e, em alguns casos, não podem ser removidos dos seus cargos ou transferidos de cidade ou repartição.
Além disso, ao se aposentarem, recebem o equivalente ao seu último salário, diferentemente do cidadão comum, que tem uma aposentadoria com o teto máximo de R$ 3 mil. Diante dessa distorção, cada aposentado do sistema geral gera um déficit anual para a previdência de R$ 2 mil, enquanto que os aposentados do governo federal, por exemplo, geram um déficit de R$ 50 mil, segundo estudo do jurista Ives Gandra Martins.
Os servidores estão dentro da lei e adquiriram esses direitos inclusive por causa do seu expressivo lobby junto aos parlamentares e pela força do corporativismo. Muitos deles, ressalve-se, trabalham além do horário, usam seus carros e outros recursos particulares para fazer bem suas tarefas, e lutam contra adversidades de toda a ordem, como falta de equipamentos e uma burocracia sem limite.
Seria injusto generalizar, mas a verdade é que existe um número exagerado de servidores públicos e a maioria deles tem um regime diferenciado de trabalho e aposentadoria, que os coloca numa situação de privilégio diante dos demais cidadãos que, em última instância, são responsáveis pelo pagamento dos seus salários.
O problema é que essas distorções e privilégios ajudam a comprometer tanto a receita quanto o processo de gestão dos governos, contribuindo para um cenário desolador, de baixa qualidade de serviços públicos e carência de obras fundamentais para o atendimento à sociedade e melhoria da qualidade de vida.
Diante disso, é preciso estarmos atentos e vigilantes a toda possibilidade de aumento de custos por parte dos governos, e ainda estarmos presentes nas discussões sobre como melhorar esse estado de coisas. Uma boa sugestão é de que, para todas as contratações do poder público, a partir de agora, seja respeitado um regime de trabalho ao qual são submetidos os demais trabalhadores do país.