Por Emerson Souza Gomes (*)
É sabido que o desembarque de carga em portos pode se tornar por demais moroso, fazendo com que o motorista aguarde dias em fila ou pátio até que se inicie a operação. Com a entrada em vigor da Lei 12.619, regulamentando a profissão de motorista, deve-se dar atenção especial ao “tempo de espera”, instituto jurídico previsto na nova legislação, já utilizado em outros países, e que aparentemente é de aplicação singela, mas que assume peculiaridades em determinadas operações de transporte, sobretudo, naquelas realizadas em portos públicos.
Passada a jornada normal de trabalho, acaso o motorista tenha que acompanhar operações de fiscalização; embarque/desembarque de carga; ou, por ordem expressa do empregador, não puder se afastar do veículo, este tempo passa a lhe ser devido na razão do salário-hora acrescido de 30%. A questão é: todas as horas de fila devem ser consideradas como espera? De imediato: não. Sem delongas – acaso for conveniente ordenar que o motorista fique junto do veículo – dos dias de fila devem ser subtraídas as horas relativas à jornada normal; aos intervalos para almoço; e aos intervalos para repouso entre duas jornadas de trabalho. Do saldo restante obtêm-se as horas relativas ao tempo de espera as quais serão indenizadas ao empregado. Frise-se: indenizadas! Não geram contribuições para FGTS, INSS e desdobramentos em verbas de natureza salarial.
Ainda quanto a operações de transporte na área portuária, outra questão que se põe é: no caso de ser necessário movimentar o veiculo durante a madrugada, poderá o motorista interromper o descanso de 11 horas? Faz-se esta menção posto que a legislação do trabalho não prevê de ordinário a possibilidade de fracionamento ou de interrupção do intervalo para repouso entre duas jornadas de trabalho.
É flagrante que por vezes o legislador remete empregador e empregado à livre negociação; pode-se dizer que sinalizou em vários momentos a via sindical como meio de compatibilizar a lei à realidade do serviço de transporte, inclusive por conta das peculiaridades de cada operação. Nisto toma saliência o disposto no art. 235-H inserido na CLT, que autoriza que outras condições de trabalho, desde que não prejudiciais à saúde e à segurança do trabalhador, possam ser previstas em convenções e acordos coletivos, observadas a legislação do trabalho.
Não se quer aqui apontar uma solução isenta de riscos para o problema. Seria leviano, no entanto, com o dispositivo, abre-se uma janela para se estruturar cláusula em acordo coletivo de trabalho prevendo o fracionamento do intervalo de 11 horas ou de ajuste prevendo indenização no caso da sua interrupção. Diz-se isto pelo fato de que a 12.619, quanto ao TAC-agregado, admite o fracionamento do descanso obrigatório de 11 horas em 9 mais 2 horas. Ora, dado os objetivos da lei, se sob a ótica do trabalho autônomo o fracionamento não compromete a segurança rodoviária, presume-se também não comprometer a segurança e a saúde do trabalhador. No mais, a igualdade no exercício da profissão deve ser preservada.
Concluindo; a Lei 12.619 não só impõe uma alteração de postura das empresas que operam no setor, revendo rotinas de trabalho, investindo em gestão de recursos humanos e reprogramando viagens – fatores que passam a compor o custo do frete. Não é necessário um olhar aquilino para se concluir que com as novas regras o investimento em outros modais se faz imprescindível, sob o prejuízo de termos majorado ainda mais o custo do frete, destacando-se aqui o custo da atividade portuária – o gargalo de cargas – o que por si só representa um entrave para a integração dos modais de transporte, da eficiência….da competitividade!
(*) advogado, especialista em direito empresarial e sócio da Pugliese e Gomes Advocacia, www.pugliesegomes.com.br